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segunda-feira, 30 de março de 2015

A Intermitência da Morte – José Saramago (resenha)

Sempre que termino um livro nunca sei se digo, mais um ou menos um. São tantos que ainda me faltam ler. Empolgada com o fim da leitura desse livro cujo título consta acima, resolvi fazer uma resenha para ajudar-me a refletir melhor a obra e estimular aqueles que ainda não leram a se embrenharem por essas paginas deliciosas de serem lidas. 

O livro editado em 2005 pela Companhia das Letra, SP, é tão intermitente quanto a própria morte que nele se apresenta. Não que todas as mortes sejam intermitentes, mas essa em particular não é nada constante. Um país que não se sabe em que continente e nem o nome, um tempo que por suposição sabe-se contemporâneo pelas facilidades tecnológicas, nem tão avançadas quantos as atuais, porém se reconhece um certo desenvolvimento característico de uma sociedade capitalista.

A história começa com a seguinte frase: No dia seguinte ninguém morreu. Então aquela população que até então só tinha como única certeza real e impreterível da morte, acorda pela manhã com a certeza inversa que ninguém mais morrerá.  Porém, algo que deveria fator de comemorações e gozo, passa a ser causa dos maiores entraves nunca dantes visto naquelas bandas. Daí em diante,  paginas e paginas de uma crítica social muito bem construída recheada de escárnios. Como uma sociedade capitalista que tem como base a especulação de capital para obtenção de poder, não deixando escapar nem mesmo as agruras dessa tão temida senhora, fará para não deixar lhe escapar os filões d’antes embolsados com o fim de Thanatos? Como uma sociedade que tem em sua religiosidade a função de mantenedora dos moldes e padrões e tendo na morte fator preponderante de achacamento dos fieis através do pecado e promessa de um paraíso após o desenlace carnal poderá se sustentar? Como esta mesma sociedade se livrará de milhões e milhões de moribundos, verdadeiros mortos-vivos que se formam em legiões, já que o fato de ninguém morrer não quer dizer que as pessoas deixam se convalescer?

O Já o segundo momento é mais denso, existencialista e filosófico, sendo necessário uma atenção e um cuidado maior, porque é onde a trama se estabelece e segue seu fluxo. O final é obvio, e o próprio Saramago assume essa postura, ao afirmar que sim, acontecerá o que todos esperam, porém...e aí está: da mesma forma que o segredo do quadro não é a obviedade do tema e sim as maneira como o artista o representa, assim se dá também com a literatura. Nesse ponto Saragamago grandiosamente preenche seu quadro com pinceladas generosas de poesia e beleza, provando mais uma vez sua genialidade.


É um romance que nos faz pensar sobre a seriedade demasiada com que encaramos vida, a necessidade de controle sobre tudo o que nos cerca e  com isso deixamo-la passa, e que até mesmo a morte (com m minúsculo que assim ela se identifica) tem o direito de viver e amar.